Em novembro foram encerradas as atividades de campo do Projeto Ouro Sem Mercúrio, com visitas complementares no Pará, em Itaituba,Tucumã e Ourilândia do Norte. Ao longo do ano foram visitadas mais de 30 regiões, considerando municípios e distritos, nos Estados de Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará e Rondônia.
Estas visitas permitiram a coleta de dados técnicos que vão subsidiar a elaboração do Plano de Ação Nacional do Brasil no âmbito da Convenção de Minamata e só foram possíveis porque a comunidade garimpeira — interessada em formalização, legalização e eliminação do mercúrio — contribuiu ativamente para viabilizar a entrada dos pesquisadores nas comunidades e nas suas casas. Foram 13 cooperativas auxiliando para garantir a realização adequada dos trabalhos, que também contou com a colaboração de universidades parceiras, instituições de pesquisa, prefeituras e lideranças comunitárias.
O ponto central dessa jornada foi ouvir as comunidades a respeito dos desafios e perspectivas sobre o futuro do garimpo, sendo entrevistados mais de mil garimpeiros e realizadas sete oficinas com as comunidades, três delas específicas para mulheres. Além disso, foram coletadas amostras de materiais que estão agora em análise laboratorial, que irão auxiliar a equipe do projeto a apontar aspectos nos quais o suporte técnico para os garimpos serão prioritárias.
O contato direto com as pessoas que estão na ponta dessa cadeia, comprovaram a complexidade do desafio da eliminação do mercúrio. “Nos diálogos surgem visões e histórias de vida diferentes. Algumas pessoas com pouca informação, falta de clareza sobre o assunto não conseguem se posicionar de forma segura sobre o tema. Há reconhecimento de que o mercúrio impacta a saúde e o meio ambiente, há inclusive relatos que lamentam e sentem a perda de pessoas conhecidas e próximas por causa do mercúrio, mas eles não sabem como continuar na atividade sem o metal”, conta Carlos Henrique Araujo, coordenador dos trabalhos de campo.
O projeto trará dados inéditos e extremamente relevantes para as instituições brasileiras responsáveis pela formulação de políticas públicas relacionadas à mineração artesanal de ouro.
Veja no infográfico abaixo um resumo dos resultados do trabalho de campo. Veja a versão em Inglês ou Espanhol.
Presente de ano novo: o caminho para soluções duradouras
Existem novas tecnologias sendo desenvolvidas, e podem funcionar para eliminar o mercúrio da atividade. Somente neste ano o projeto Ouro Sem Mercúrio conheceu diversas alternativas, algumas promissoras e outras que requerem um estudo mais profundo para evidenciar suas potencialidades. Também existem métodos já consolidados de reduzir e controlar melhor o uso do metal tóxico, evitando a contaminação das pessoas e da natureza.
No entanto, as atividades de campo comprovam que chegar a uma gestão melhor do mercúrio e quem sabe à sua eliminação gradual exige um esforço conjunto de todos os setores envolvidos direta e indiretamente, em ações contínuas e duradouras de envolvimento e capacitação nas esferas legal, ambiental e de saúde e segurança do trabalhador.
“O que observamos a campo é que existe boa vontade das comunidades garimpeiras que querem trabalhar da forma correta, com menores impactos sobre o meio ambiente e sem conflitos. Ninguém quer prejudicar seus vizinhos e muito menos ficar em uma situação de medo permanente da ação do governo federal. Mas observamos também que infelizmente não existem ações efetivas de suporte e envolvimento dessas dezenas de milhares de pessoas que vivem do garimpo” relata o Coordenador de Articulação Institucional do Projeto, Hassan Sohn.
O contato direto com os garimpeiros trouxe à tona os pedidos de apoio, orientação e meios de cumprir a lei, embora nos diálogos reforcem que recebem apenas repressão e ataques à sua imagem. “É um fato: nem boa vontade e nem melhores intenções fazem o conhecimento surgir do nada, é necessário investimento do poder público em conhecimento técnico e capacitação; sobretudo é necessário diálogo, um esforço intensivo para recriar laços de confiança destruídos por anos de abandono. Não se vence a criminalidade marginalizando setores da sociedade, mas sim mostrando os caminhos para uma integração social e resgatando a cidadania das pessoas”, defende Sohn.
O Projeto Ouro Sem Mercúrio acredita que é possível trilhar um caminho que resgatará a cidadania dos garimpeiros, devolvendo a dimensão humana para essas pessoas e auxiliando-as a trabalhar com as melhores práticas e melhores tecnologias, para assim termos um garimpo nos níveis máximos de responsabilidade, nos locais corretos e com partilha efetiva dos benefícios da produção de ouro com as comunidades locais.
Em 2024 o projeto trabalhará para isso, ajudando na construção do Plano Nacional de Ação para a Mineração Artesanal e em Pequena Escala de Ouro.
Agradecimento aos Garimpeiros
Encerramos o ano agradecendo aos garimpeiros que nos receberam com muita boa vontade, que estão empenhados em construir um futuro melhor e querem trabalhar com segurança técnica e jurídica.
O forte engajamento da comunidade garimpeira, das cooperativas, associações e demais organizações locais foram essenciais para o desenvolvimento de um processo de identificação dos desafios para eliminar o mercúrio e revelou opções para construir um consenso entre as partes interessadas para uma atividade mais próxima das melhores práticas ambientais e técnicas.
A nossa missão foi comprida com êxito. Com a perseverança dessa comunidade o Brasil pode liderar o caminho para ter um garimpo de ouro livre de mercúrio, beneficiando as pessoas e o meio ambiente.